A cultura da escassez

A cultura da escassez

Você já se sentiu insuficiente? Esse é um dos sentimentos da cultura da escassez. Sobretudo, a própria palavra escassez se apresenta ao mundo como algo negativo. Principalmente quando pensamos na humanidade, a escassez é a afirmativa de que não há recursos o suficiente para que todas tenham a mesma condição de vida. Ou seja, ela se abastece da falta.

Mas nós fizemos dela algo bom e aqui temos um problema. No âmbito do Marketing Digital, a escassez é usada como um gatilho de atração, com a premissa de que todos desejam algo que é extraordinário e limitado. E nós vimos isto em todos os lugares: “restam apenas 2 unidades”, “exclusivo”, “você sendo única” e etc.

Se fazemos isso com serviços e objetos, quem nos disse que não acabaríamos fazendo com pessoas, não é mesmo? A escassez nas nossas vidas chega com exigências: sempre mais, você tem que ser alguém em destaque e melhor que os outros. E muitos de nós, não percebem o quão estamos inseridos nessa cultura e ao mesmo tempo somos agentes ativos na manutenção dela.

A não suficiência

Se eu preciso sempre ser mais e melhor, então sempre me faltará algo. Ou seja, o tempo, a beleza, o conhecimento, as habilidades e as características que tenho nunca serão suficientes. Eu nunca serei o suficiente.

Brené Brown ao discorrer sobre o assunto ela mergulha no narcisismo para explicar. Ela aborda o quanto as pessoas facilmente tem usado o termo narcisista para se referir à pessoas egoístas que possuem interesse unicamente em sucesso e poder. Mas o grande ponto de destaque que quero trazer com as palavras de Brené é que a forma como temos feito essa identificação dos narcisista parece muito mais satisfazer o nosso próprio ego, pois faz com que “nos sintamos melhor a respeito de nós mesmos e deposita a culpa no outro” (Brené Brown, 2012).

Ao examinar o narcisismo pelas lentas da vulnerabilidade, Brené nos permite conhecer a humanidade desse comportamento. É reconhecer que há uma pessoa antes de uma escolha e que ela não se resume a um comportamento. Assim, é possível enxergar os medos envoltos nessa relação, principalmente “o medo da humilhação de ser alguém comum” (Brené Brown, 2012).

Ser comum

Essa é sim uma crítica a uma sociedade que nós mesmos criamos, com diversas mensagens diárias que a vida comum é sem sentido e que temos que nos esforçar em ser mais do que somos. Associamos o nosso valor a atenção, sucesso e fama. E novamente, não nos considero mera vítimas de um sistema, mas agentes ativos que reforçam essa ideia.

Ah Vanessa, você está exagerando.

Quando trago a questão da atenção, sucesso e fama não estou dizendo que todas as pessoas querem ser grandes famosos, passando na televisão ou com muitos seguidores nas mídias sociais. Mas que todos nós nos esforçamos para nos destacar. São as ideias de grandeza e a necessidade de admiração que nos coloca numa posição similar àqueles narcisistas que tanto julgamos.

Não me entenda mal, não estou lhe chamando de narcisista, mas querendo promover a desconstrução desse diagnóstico que não contribui muito com a mudança desse comportamento. Nosso primeira opção ao lidar com os que consideramos narcisistas é a humilhação, achamos que colocando-os “em seu lugar” estamos fazendo um bem para eles. A questão é que a humilhação está na base desse comportamento, é o medo dela que o sustenta. Por isso, ela não é a saída.

A fonte da escassez

Nunca ser ou ter o suficiente. Quando todos estão conscientes da inadequação e da falta, a escassez ganha lugar. E ela piora à medida que seus três grandes fatores vão sendo desenvolvidos em nossas vidas com mais força. Já percebeu como, muitas das vezes, nós acabamos de abrir os olhos após uma noite de sono e já começamos a ponderar tudo o que falta em nosso dia?

E acabamos pensando que não temos:

  • tempo o suficiente
  • habilidades o suficiente
  • conhecimento o bastante

ou que não somos:

  • boa o bastante
  • sou magra o suficiente
  • bonito o bastante

Os três grandes fatores da cultura da escassez

Vergonha: Está ligada à humilhação. Nem percebemos o quanto nos controlamos e tentamos controlar os outros utilizando do medo da depreciação e da exposição. É a necessidade de apontar culpados (inclusive a si mesmo) e de buscar a perfeição. Seja lidando com o nosso próprio corpo ou com nossa profissão, a vergonha atua de forma constante e opera com a necessidade de aceitação vinda do outro.

Comparação: Externa ou interna. É a constante análise do que temos e não temos em relação ao que o outro tem ou não tem. Outro aspecto dela é a nostalgia do passado, quando comparamos nossa vida com uma situação passada em que considerávamos muito boa, “bons tempos!”. Esse aspecto encontra-se presente nos mais diversos campos da nossa vida.

Desmotivação: Quando temos medo de criar algo novo e tentar coisas novas. Quando há a percepção de que ninguém ouve ou vê. A comparação de certa forma, permite que a desmotivação ganhe raízes profundas e ela está intrinsecamente ligada à ideia de que nunca atingiremos o desejado.

Superando a cultura da escassez – um desafio diário

Superar a escassez exige um compromisso diário com a vulnerabilidade. É a busca por viver com ousadia, não ignorando emoções, mas nutrindo uma constante posição de questionamento sobre o que nos é imposto. Não se trata de cultivar o excesso, mas enfrentar a incerteza e todos os riscos emocionais, acreditando que você é suficiente. Isso implica aceitação de quem você é e, muitas das vezes, perpassa desenvolver uma consciência crítica e reflexiva.

Eu sei, é um mega desafio, mas começa com boas doses de amor próprio e autovalorização. E cresce à medida que vamos enfrentando o medo da humilhação e do ridículo e nos permitimos compartilhar o que nos afeta. Implica coragem, mas também implica medo. Ambos em suas medidas certas.

Quer conversar mais sobre como a cultura da escassez afeta sua vida? Marque um atendimento comigo!

Autor