O diálogo não é comum!
No dicionário, um dos significados encontrados para a palavra “diálogo” é “fala interativa entre duas ou mais pessoas”. Gostaria aqui de destacar a palavra “interativa“ que aparece na frase, pois acredito que ela seja o ponto central do que abordarei nesse post.
Como seres formados pela linguagem nós aprendemos a conversar com outras pessoas, interagindo, desde muito cedo. Mas é muito provável que muitos de nós não tenhamos experimentado o diálogo a todo o momento. O diálogo não é algo natural, na verdade nos primeiros anos de vida a preocupação maior é em ensinar as crianças a falarem, não a ouvirem.
Todavia, entendo essa preocupação, pois é por meio da linguagem que somos capazes de significar o mundo ao nosso redor e as experiências que nos esperam. Assim como, adquirimos a habilidade de informar ao outro o que queremos. Penso em uma criança nas fases iniciais de seu desenvolvimento, no qual consegue externalizar que deseja água, por exemplo. É primordial que ela aprenda como o fazer e assim o faça.
Quer um exemplo mais cotidiano?
Mas, eu gostaria de te fazer analisar com mais cuidado. Você já percebeu quando uma criança não quer te ouvir? Vivenciei isso esses dias, eu e meu noivo chamávamos várias vezes pelo nome do nosso sobrinho (estando ao lado dele), mas ele estava tão voltado para outras questões que simplesmente não queria nos ouvir. E diligentemente, escolheu não ouvir. E você já percebeu quando você está explicando algo para uma criança e ela, em sinal de negação, rejeita tudo o que você disse? Não importa o quanto você explique que ela não pode fazer algo ou que não é o momento, o desejo dela não está para negociação.
Essa para mim são as constatações mais fiéis para presumirmos que o diálogo não é natural, mas aprendido. Acima disto, me faz refletir que o diálogo não é comum, pois não somos ensinados a participar deles logo cedo. E assim como precisamos aprender a falar, é necessário aprendermos a ouvir, para que possamos desenvolver os diálogos.
Diálogo é a base das relações saudáveis
Qualquer tipo de relação funciona com comunicação, seja ela verbal ou não. Interagimos uns com os outros dessa forma. Nossos diálogos estão carregados da nossa relação com a temporalidade: passado, presente e futuro. Eles despertam emoções e carregam histórias.
Possuem diferentes interlocutores, que são convidados a falar de acordo com o entorno, ou seja, com o ambiente e as pessoas que estão. Todavia, quando falamos do diálogo como a base para relações saudáveis, estamos discorrendo de diálogos colaborativos.
Diálogos colaborativos são regados pela escuta do outro, pela posição de empatia e vulnerabilidade. É adentrar numa conversa sem querer fazer o outro engolir as nossas convicções. É ouvir para compreender. São esse tipo de diálogos que possibilitam o desenvolvimento de relações saudáveis com os outros, independente da relação que se estabelece.
Ah Vanessa, então tudo pode ser resolvido no diálogo? Resolvido talvez não, dissolvido sim. Alguns problemas apenas são dissolvidos com a expansão do diálogo, ou seja, perdem sua força e ganham outros significados.
O diálogo não é espontâneo até que o tornemos. E só podemos o tornar espontâneo participando dele. Por isso, precisamos constantemente estar em trocas dialógicas para aprendermos a tornar o diálogo espontâneo e comum na forma como nos relacionamos.
O diálogo é ameaçador!
Muitas pessoas quando buscam psicoterapia descrevem na primeira sessão os sentimentos e pensamentos que tinham em relação a essa relação terapêutica. Para alguns, esse primeiro encontro é acompanhado de muita vergonha, medo e ansiedade. E isso por diferentes motivos: preconceitos com a profissão, receio do que irá falar e do que irá ouvir, experiências ruins.
Quando penso nas pessoas que já atendi, nas que atendo e até mesmo no meu próprio processo vejo o quanto essa relação terapêutica é regada por diálogos. E os diálogos, num primeiro contato, podem ser extremamente ameaçadores por pelo menos 3 (três) motivos:
Motivo A: Diálogos exigem vulnerabilidade.
Sabe aquele momento em que a coragem e o medo se encontram? É isso que podemos chamar de vulnerabilidade. É reconhecer seus altos e baixos, permitindo que eles apareceram. E “experimentar a vulnerabilidade não é uma escolha – a única escolha que temos é como vamos reagir à ela, ou seja, quando formos confrontados a incerteza, o risco e a exposição emocional” (Brené Brown, 2012).
Motivo B: Diálogos exigem escuta.
Escutar o outro é difícil, mas escutar a si mesmo também é. Pode ser muito dolorido e difícil ouvir você mesmo dizendo coisas que permeiam seus diálogos internos. Principalmente, pois implica assumir que você pensa daquela forma. Novamente perpassamos a questão da vulnerabilidade e de como eu permito que os outros me vejam.
Motivo C: Diálogos exigem reflexão.
Se pudéssemos ter as respostas rápidas para todos os nossos problemas, independente do custo, eu acredito que muitos de nós optaríamos por pagar esse preço. Refletir requer esforço de nós em reconhecer e conhecer muito sobre quem somos e quem queremos ser. Não é fácil, não é simples. Muitas das vezes é confuso e contraditório.
Ser vulnerável no diálogo, buscando genuinamente compreender o outro e se fazer compreendido, pode ser ameaçador, mas também é libertador. E a melhor forma de analisar se você está inserido em relações com bons diálogos, assim como se você está promovendo bons diálogos é entendendo quando não há diálogo.
Não há diálogo…
Quando só um fala
Longe de ser um diálogo, só poderíamos chamar de monólogo. Ao não dar espaço para que o outro fale permanecemos sem nos colocar em diálogo. Isso não indica que ambos devem falar ao mesmo tempo, mas que deve haver um momento para que cada um reflita no que foi dito e elabore a sua fala.
Quando há violência verbal
Uma comunicação violenta não é uma comunicação assertiva. Desconsiderar o outro em sua subjetividade e agredi-ló verbalmente não é se comprometer com o diálogo. Uma fala que apenas aponta dedos e não considera sua parte no processo é violenta. E por isso, é importante saber comunicar aquilo que lhe afeta sem ferir o outro.
Quando eu escuto para responder, não para entender
Ouvir o outro não é uma tarefa fácil, ainda mais se o que o outro diz vai contra algo que eu acredito. Todavia, dialogar é sustentar as diferenças nos discursos e buscar entender o que o outro diz pelo ponto de vista dele. E tenha em mente que entender não significa concordar.
Quando não estou disposto a negociar
Ou seja, quando não estou aberto para mudar minhas opiniões. E a grande diferença que precisa ser feita aqui é que isso não significa que vou vai mudar, mas que possuo disposição para mudar, caso perceba que faz sentido para mim. Essa é uma posição realmente difícil para algumas pessoas, por a enxergar como uma ameaça a si.
Quando interrompo a fala do outro
Se há interrupções propositais fica mais fácil de se notar esse tópico, mas quando há o aproveitamento do tempo de pausa do outro para iniciar sua própria fala, isso também aparece. E isso requer cuidado, porque sutilmente pode ser uma interrupção. Quando as interrupções se tornam frequente e é perceptível que não há reflexão, mas apenas o desejo de falar, tenha cuidado, pois isso não é diálogo.
Quando não reflito sobre o que ouço
Reflexões são peças fundamentais nos diálogos, pois elas trazem a tona nossa diálogo interno sobre o que nos foi dito. E se nos deixarmos levar pelas respostas espontâneas que temos, ou seja, aquelas respostas que já estamos acostumados a dar, perdemos a riqueza dos diálogos. Essa riqueza é a de proporcionar NOVOS DIÁLOGOS, internos e externos. Se nos contentamos com o que já está pronto no nosso repertório não nos abrimos a novos significados que poderiam surgir.
Espero que esse conteúdo tenha lhe ajudado a expandir seus diálogos!
- Autor
- Nome
- Vanessa Mattos
- Psicóloga Clínica - CRP 12/19336